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A Guerra na Era da Informação

Publicado: Terça, 05 de Junho de 2018, 08h01 | Última atualização em Quinta, 06 de Janeiro de 2022, 13h46 | Acessos: 2497

Rodrigo de Almeida Paim1
Alexandre Checheliski2
Rodrigo Lima França3
Orlando Mattos Sparta de Souza4

Introdução

A presente apreciação trata sobre a palestra “A Guerra na Era da Informação”, ministrada pelo Senhor Coronel Alessandro Visacro, Chefe do Estado-Maior do Comando de Operações Especiais (COpEsp), do Exército Brasileiro, no dia 10 de maio de 2018, na Escola de Comando e Estado-Maior do Exército (ECEME).

Naquela oportunidade o palestrante ressaltou a importância da percepção que diferencia a guerra da Era Industrial da guerra da Era da Informação. Com relação ao assunto, foi ressaltado o papel da tecnologia da informação que, somado à mobilidade, garante maior rapidez no fluxo de pessoas, ideias, serviços, bens e capital. O resultado da soma desses dois fatores tem provocado, de forma sistêmica, a relativização – ou “degradação” nos termos do autor - das distâncias, do tempo e do poder, na sociedade do século XXI.

Em grande medida, na “era da informação” as redes sociais tem papel relevante em alterar a natureza das guerras e das relações de poder entre os diversos atores envolvidos, uma vez que alcançam grande capilaridade a partir da rede mundial de computadores.

 

Desenvolvimento

Após o 11 de setembro de 2001 e com o crescimento e amplo acesso à internet, verificou-se o surgimento das novas e difusas ameaças. Cabe destacar a mudança do ambiente no cenário internacional, que atualmente é caracterizado pelo acrônimo V.U.C.A. e tem provocado a convergência das ameaças, nos chamados “Eco” Sistemas Complexos Adaptativos.

Nesse contexto de ameaças híbridas, observa-se a dificuldade que o Estado-nação tem em exercer e manter sua soberania. A globalização e as relações de interdependência, ignoram as fronteiras estatais, o que implica na perda do status do Estado-nação como único ator relevante no cenário internacional. Com isso, cresce de importância a opinião pública, que exerce papel cada vez mais determinante nas disputas de poder pelo protagonismo no interior dos Estados, tendo em vista a menor tolerância e pré-disposição para arcar com os custos de uma guerra total.

O Cel Visacro também alertou, que no ambiente VUCA, verifica-se o predomínio absoluto da violência armada, não estatal, organizada, endêmica e hiper-difusa, que coloca em evidência o ator armado não estatal e acena para o fim do monopólio do Estado sobre o uso da força. Esse cenário cria um paradoxo de soberania que se antepõe ao tradicional modelo vestfaliano, com o surgimento de áreas não governadas, conhecidos como Black Spots, que são protetorados urbanos sem lei, que se caracterizam pela ausência da ação estatal, evidenciando um déficit de soberania.

Na leitura do autor, o estado moderno pode ser compreendido como a união entre povo, território e soberania. Enquanto processo histórico, o objetivo principal deste Estado seria prover segurança a sua população. A soberania se reveste de legitimidade para garantir a segurança como bem comum. Partindo de uma perspectiva normativa, o Cel Visacro acentua que a soberania deveria ser: absoluta, perpétua, inalienável, una, indivisível, imprescindível e exclusiva. Ao observar o século XVIII e as Revoluções Francesa e Industrial, é fácil entender que com o advento da guerra total, a defesa territorial representava o fiel da balança entre guerra e paz.

Com base nos trabalhos publicados pelo “Uppsala Conflict Data Program” (UCDP), o Cel Visacro destacou que o número de conflitos entre estados, no período compreendido entre os anos 1946 e 2014, apresentou um considerável decréscimo, ao passo que os conflitos entre atores não-estatais cresceram, apontando para a perda do que Max Weber chamou de monopólio estatal do uso da força. Dessa forma, verifica-se que o estado nacional tem tido dificuldade de atender às demandas crescentes de sua sociedade e, seu ponto de inflexão não é mais a segurança externa, uma vez que a ação dos atores armados não-estatais exerce influência direta e indireta sobre os elementos materiais do estado, afetando sua soberania.

Vitórias táticas significativas no campo de batalha não significam sucesso contra as novas ameaças, uma vez que a expressão militar empregada isoladamente não atingirá o estado final desejado, mas sim o engajamento coordenado de todas as expressões do poder nacional.

O palestrante chamou atenção para o comentário do general norte-americano McChrystal, acerca de que “fazer certo as coisas” é bem diferente de “fazer as coisas certas”. Citou a construção da Linha Maginot pelos franceses. Obra de arte magnífica, cinco níveis abaixo do solo, com infraestrutura invejável, que possuía cúpulas de aço na superfície, trilhos de ferro, etc. Tudo construído com a finalidade de impedir que a Alemanha invadisse a França pela Alsácia e Lorena. Realmente, a Alemanha não invadiu a França por onde os franceses imaginavam, no entanto, o fez pelos Países Baixos, pelas florestas da Ardenas.

A linha Maginot resolveu uma face do problema, mas não resolveu o REAL problema.

Esse episódio nos leva a refletir que, na maioria das vezes, nos deparamos com operações militares bem executas, bem planejadas, que exprimem um caso de sucesso, do ponto de vista militar, deixando a desejar, todavia, no que se refere ao caráter efetivo, revelando-se pouco representativa. Isso ocorre pelo motivo de se concentrar o foco no processo.

Para finalizar, o Cel Visacro alertou que o emprego REPETIDO em GLO, na última década, tem formado uma geração de oficiais e praças mais habituados (ou afeitos) à atividade de GLO do que às Técnicas Táticas e Procedimentos (TTP) típicas de uma guerra convencional. Há que se compreender que são conflitos bastante diferentes e peculiares. O que permite afirmar que quem está preparado para o combate convencional, não necessariamente pode bem combater no ambiente urbano. Trata-se de diferentes capacidades, requeridas de um mesmo soldado, num ambiente complexo e difuso.

 

Aspectos Conclusivos

No mundo atual, devemos focar no resultado, alertou o coronel. A permissividade do uso da força já não é a mesma que existia nos anos de 1940. Seja pela aceitação da sociedade (opinião pública e preceitos jurídicos), seja pela nova maneira como as ameaças se apresentam ou, até mesmo pelo novo jeito de combater (em ambientes urbanos e humanizados).

Isso nos faz refletir sobre a doutrina de Garantia da Lei e da Ordem (GLO) do Exército Brasileiro, que foi formulada e desenvolvida num contexto particular, deve passar pelo correto entendimento do problema, nas dimensões física, humana e informacional. Assim, o problema da segurança pública no Brasil pode ser encarado, não somente como um problema de Segurança, mas sim como um problema típico da Era da Informação, resultando no envolvimento pleno de todas as expressões do poder do país, em especial, da política e da econômica.

À luz dessas breves considerações, destaca-se que a palestra do Cel Visacro contribuiu com o desenvolvimento do pensamento crítico sobre a temática em tela, uma vez que o emprego de meios militares na “Era da Informação” necessita ser reforçado pelas expressões política e econômica. Nesse contexto, o Brasil possui o desafio de incrementar sua infraestrutura, investir em tecnologia da informação, e atender em melhores condições as demandas básicas da sociedade, a fim de dissuadir atores perturbadores da ordem pública.

 

Para saber mais:

VISACRO, Alessandro. A guerra na era da informação. São Paulo: Editora Contexto, 2018.


1 Tenente Coronel do Exército Brasileiro, doutorando pelo Programa de Pós-Graduação em Ciências Militares (PPGCM) da Escola de Comando e Estado-Maior do Exército (ECEME). E-mail: Este endereço de email está sendo protegido de spambots. Você precisa do JavaScript ativado para vê-lo.
2 Major do Exército Brasileiro, doutorando pelo PPGCM da ECEME. E-mail: Este endereço de email está sendo protegido de spambots. Você precisa do JavaScript ativado para vê-lo.
3 Major do Exército Brasileiro, doutorando pelo PPGCM da ECEME. E-mail: limafrançEste endereço de email está sendo protegido de spambots. Você precisa do JavaScript ativado para vê-lo.
4 Major do Exército Brasileiro, doutorando pelo PPGCM da ECEME. E-mail: Este endereço de email está sendo protegido de spambots. Você precisa do JavaScript ativado para vê-lo.
5 Sigla em inglês, cunhada no âmbito das Forças Armadas norte-americanas, que é usada para designar as palavras volatile, uncertain, complex e ambiguous, que correspondem a volátil, incerto, complexo e ambíguo, respectivamente. Disponível em: http://drvidyahattangadi.com/dealing-with-vuca-world/

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