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A Mídia, a Percepção do Risco e a COVID-19

Publicado: Terça, 14 de Abril de 2020, 08h01 | Última atualização em Quinta, 06 de Janeiro de 2022, 13h56 | Acessos: 1618

Carolina Gomes Raffagnato
Mestrando em Ciências Militares pelo PPGCM/ECEME

 Em 31 de dezembro de 2019, a Thomson Reuters, agência de notícias britânica e considerada maior agência internacional de notícias do mundo, publicava a seguinte matéria: “Chinese officials investigate cause of pneumonia outbreak in Wuhan”1. Desde então, uma quantidade enorme de informações sobre a doença são veiculadas em jornais impressos, televisionados ou digitais. A disseminação de tais notícias aumenta com o crescimento do risco do vírus para o mundo, mostrando a importância e a proporção que o assunto ganha no cenário internacional.

COVID-19 foi o nome dado pela Organização Mundial de Saúde (OMS) para doença causada pelo novo coronavírus responsável pelo surto de pneumonia na China (DEUTSCHE WELLE, 2020). A nova enfermidade havia superado em número de mortos a Síndrome Aguda Respiratória Grave (SARS, na silga em inglês) e até o dia 08 de abril de 2020 já havia infectado mais de 1 milhão e meio de pessoas e matado mais de 88 mil no mundo2. No Brasil, mais de 16 mil pessoas adoeceram e 820 vieram a óbito3. O vírus batizado de SARS-CoV-2, causa uma infecção pulmonar e tem como sintomas febre, dor e problemas respiratórios, sendo o terceiro a maior causa dos óbitos (CDC, 2020). Um mês após ganhar o nome de COVID-19, em 11 de março de 2020, o surto da doença foi declarado como pandemia pela OMS (EFE, 2020).

A pandemia, que chegou a todos os continentes ocasionando medidas de isolamento social e tensões internacionais na busca por equipamentos de proteção individual (EPI), levanta uma importante questão acerca da comunicação do risco. Medidas eficazes de combate ao surto do novo coronavírus, como informações sobre sua forma de disseminação, grupos de risco para doença e métodos de barreira precisam ser transmitidas e replicadas aos países atingidos, principalmente, a população, na tentativa de conter a contaminação e, consequentemente, as mortes.

A comunicação do risco é fundamental em casos de desastres e emergências sanitárias. O Guia de Comunicação Social e Comunicação de Risco em Saúde Animal, da Organização Pan-Americana da Saúde, define comunicação de risco como a capacidade de “informar e conscientizar acerca dos riscos de segurança e saúde aos quais as pessoas estão expostas e ser capaz de explicar os fatores de risco associados às endemias, aos acidentes ambientais e à atividade humana”. Para Berry (2004) os meios de comunicação de massa são fundamentais na formação da percepção do risco. De acordo com o autor, as circunstâncias particulares de cada situação fazem com que a influência da mídia seja vista como negativa ou positiva.

A análise dos fragmentos acima mostra que os meios de comunicação e a mídia possuem um papel fundamental na comunicação e na formação da percepção de risco. Para avaliar a influência da mídia na formação da percepção de ameaça frente a COVID-19, analisaram-se notícias de duas agências internacionais em seus sites dedicados ao público brasileiro. Para tal análise, escolheu-se a alemã Deutsche Welle e a espanhola EFE. Definiu-se o período de três meses, iniciando em 31 de dezembro de 2019, quando há a primeira notícia nos grandes jornais, até 31 de março de 2020, quando a Organização Mundial de Saúde já havia declarado a COVID-19 como pandemia e os primeiros casos de infectados e de óbitos já haviam surgido no Brasil. A preferência por tais jornais se deu devido ao método de busca de suas plataformas digitais, que permitia o acesso por toda linha temporal proposta. A coleta dos dados foi feita escrevendo-se “coronavírus” na barra de busca e somando-se o número de publicações por semana. Os resultados estão dispostos na Tabela 1 e no Gráfico 1.

Tabela 1: Número de publicações sobre coronavírus por semana de 31 de dezembro de 2019 até 31 de março de 2020.

Semana

Data

Número de Publicações

Deutsche Welle

EFE

1

31/12 até 07/01

0

0

2

08/01 até 14/01

1

0

3

15/01 até 21/01

5

3

4

22/01 até 28/01

19

25

5

29/01 até 04/02

30

47

6

05/02 até 11/02

17

42

7

12/02 até 18/02

16

32

8

19/02 até 25/02

12

45

9

26/02 até 03/03

42

55

10

04/03 até 10/03

49

63

11

11/03 até 17/03

64

129

12

18/03 até 24/03

97

154

13

25/03 até 31/03

86

200

Fonte: Própria Autora

Gráfico 1: Número de publicações sobre coronavírus por semana.

img grafico1

Fonte: Própria autora, 2020.

A tabela e o gráfico mostram que há um aumento considerável entre a semana 4 e 5 em ambas as agências; na Detusche Welle há um aumento maior entre as semanas 8 e 9 e que permanece ascendente até a semana 12; e na EFE o segundo aumento considerável acontece da semana 10 para semana 11, e permanece crescente até a semana 13. Para entender o comportamento desses números deve-se analisar em qual fase da pandemia o mundo estava em cada mudança do padrão.

O primeiro aumento, que ocorreu da semana 4 para semana 5, é comum para as duas linhas. Ele pode ser explicado por três ocorrências principais: no dia 31 de janeiro a OMS declarou Emergência de Saúde Global (DW, 2020); no dia 02 de fevereiro de 2020 aconteceu a primeira morte fora da China, nas Filipinas (DW, 2020); e durante toda a semana relatada, diversas notícias sobre o hospital de campanha chinês, que foi construído em 10 dias, foram publicadas (DW, 2020).

O segundo aumento, mais característico para a Deutsche Welle, é explicado por uma única notícia: em 26 de fevereiro de 2020, o primeiro caso de COVID-19 foi confirmado no Brasil, no estado de São Paulo. Diversas notícias sobre como se preparar e/ou lidar com a chegada do surto no Brasil foram publicadas. Apesar do aumento ser mais pronunciado na DW, a EFE também tem um aumento de publicações nesse período, mostrando a importância da notificação da chegada da doença no Brasil.

O salto de publicações da EFE, entre os dias 11 até 17 de março, pode ser atribuído a diversos fatos. O primeiro, e certamente mais importante, é a declaração da OMS em 11 de março de pandemia pelo novo coronavírus (EFE, 2020). A partir daí, uma sequência de notícias de importância internacional foram publicadas: em 12 de março, o secretário de comunicação do governo federal testou positivo para COVID-19 (EFE, 2020); no dia 13 de março, os EUA declararam emergência nacional por causa da pandemia (EFE, 2020); em 14 de março, o presidente dos Estados Unidos, Donald Trump, fez o teste para o coronavírus; em 16 de março o número de infectados fora da China superou o número dos infectados na China, país origem do vírus (EFE, 2020); e em 17 de março, a primeira morte pela COVID-19 aconteceu no Brasil.

A análise dos resultados mostra que uma grande quantidade de informação foi difundida para população brasileira, porém, somente estes dados não são suficientes para concluir se a comunicação foi suficiente para aumentar a percepção de risco nas pessoas. No entanto, uma pesquisa do Instituto de Pesquisas Datafolha mostra que 99% dos adultos brasileiros que possuem celular têm conhecimento do surto de coronavírus, dos quais 72% se dizem bem informados, 24% mais ou menos informados e 3% mal informados. 1% não possuía conhecimento sobre o tema. Os valores estão dispostos no Gráfico 2. A pesquisa ainda revelou que 74% das pessoas têm algum medo de ser infectado pelo coronavírus, 83% avalia que corre algum risco de se infectar com o vírus e 88% avalia como muito sério o surto de coronavírus no Brasil (DATAFOLHA, 2020).

Gráfico 2: Conhecimento sobre COVID-19 da população brasileira.

img grafico2

Fonte: Datafolha, 2020.

Como resultado da análise, conclui-se então que o aumento da divulgação de notícias sobre a pandemia de coronavírus no Brasil aumentou concomitantemente à percepção do risco da doença, sendo a mídia um fator crucial para comunicação deste risco para população, informando medidas de segurança pessoal e também de contenção da doença, fazendo com que uma possível contaminação desenfreada por falta de conhecimento da emergência sanitária seja evitada. De fato, somente ao final da pandemia será possível dizer se as medidas de comunicação de risco foram efetivas para diminuir a contaminação das pessoas e, consequentemente, diminuir o número de mortes. No entanto, o que se pode concluir agora é que a propagação das notícias foi efetiva em gerar conhecimento sobre a pandemia.

Rio de Janeiro - RJ, 09 de abril de 2020

 


1 Em português: autoridades chinesas investigam causa de surto de pneumonia em Wuhan.
2 Dados disponíveis em https://www.worldometers.info/coronavirus/
3 Dados disponíveis em https://www.worldometers.info/coronavirus/country/brazil/


Como Citar este documento:

RAFFAGNATO, Carolina Gomes. A Mídia, a Percepção do Risco e a COVID-19.Observatório Militar da Praia Vermelha. Rio de Janeiro: ECEME. 2020.


Referências:

REUTERS. Chinese officials investigate cause of pneumonia outbreak in Wuhan. Reuters Brasil. 2019. Disponível em: https://www.reuters.com/article/us-china-health-pneumonia/chinese-officials-investigate-cause-of-pneumonia-outbreak-in-wuhan-idUSKBN1YZ0GP

DW. OMS classifica surto do coronavírus como "ameaça muito grave" para o mundo. Deutsche Welle Brasil. 2020. Disponível em: https://www.dw.com/pt-br/oms-classifica-surto-do-coronav%C3%ADrus-como-amea%C3%A7a-muito-grave-para-o-mundo/a-52339777

CDC. Symptoms COVID-19. COVID-19. 2020. Disponível em: https://www.cdc.gov/coronavirus/2019-ncov/symptoms-testing/symptoms.html

EFE. OMS declara pandemia de novo coronavírus. EFE Brasil. 2020. Disponível em: https://www.efe.com/efe/brasil/mundo/oms-declara-pandemia-de-novo-coronavirus/50000243-4193652

BERRY, D.. Risk, Communication and Health Psychology. Open University Press. 2004.

OPAS. Guia de Comunicação Social e Comunicação de Risco em Saúde Animal. Panaftosa. 2005.

DW. OMS declara emergência de saúde global por coronavírus. Deutsche Welle Brasil. 2020. Disponível em: https://www.dw.com/pt-br/oms-declara-emerg%C3%AAncia-de-sa%C3%BAde-global-por-coronav%C3%ADrus/a-52210393

DW. Filipinas registram primeira morte por coronavírus fora da China. Deutsche Welle Brasil. 2020. Disponível em: https://www.dw.com/pt-br/filipinas-registram-primeira-morte-por-coronav%C3%ADrus-fora-da-china/a-52231474

DW. China inaugura hospital construído em 10 dias. Deutche Welle Brasil. 2020. Disponível em: https://www.dw.com/pt-br/china-inaugura-hospital-constru%C3%ADdo-em-10-dias/av-52246829

EFE. OMS declara pandemia de novo coronavírus. EFE Brasil. 2020. Disponível em: https://www.efe.com/efe/brasil/mundo/oms-declara-pandemia-de-novo-coronavirus/50000243-4193652

EFE. Bolsonaro é submetido a controle médico após Secretário de Comunicação ser diagnosticado com COVID-19. EFE Brasil. 2020. Disponível em: https://www.efe.com/efe/brasil/portada/bolsonaro-e-submetido-a-controle-medico-apos-secretario-de-comunica-o-ser-diagnosticado-com-covid-19/50000237-4194662

EFE. Trump diz que fez teste para coronavírus e aguarda resultados. EFE Brasil. 2020. Disponível em: https://www.efe.com/efe/brasil/mundo/trump-diz-que-fez-teste-para-coronavirus-e-aguarda-resultados/50000243-4196070

EFE. Governo de São Paulo anuncia a 1ª morte provocada pelo coronavírus no Brasil. EFE Brasil. 2020. Disponível em: https://www.efe.com/efe/brasil/portada/governo-de-s-o-paulo-anuncia-a-1-morte-provocada-pelo-coronavirus-no-brasil/50000237-4198114

EFE. Número de casos de Covid-19 já é maior fora da China, país de origem da pandemia. EFE Brasil. 2020. Disponível em: https://www.efe.com/efe/brasil/portada/numero-de-casos-covid-19-ja-e-maior-fora-da-china-pais-origem-pandemia/50000237-4197217

DATAFOLHA. Maioria está bem informada sobre coronavírus e defende isolamento total. Instituto de Pesquisa Datafolha. 2020. Disponível em: http://datafolha.folha.uol.com.br/opiniaopublica/2020/03/1988617-maioria-esta-bem-informada-sobre-coronavirus-e-defende-isolamento-total.shtml



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