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Brasil e Covid-19: a produção nacional de vacina como forma de superar a crise?

Publicado: Segunda, 15 de Março de 2021, 11h00 | Última atualização em Sexta, 12 de Março de 2021, 09h10 | Acessos: 1080

Gustavo Macedo

Prof. Dr. de Relações Internacionais da FMU e Pesquisador da USP

Ana Carolina Ferreira Coutinho

Graduando em Relações Internacionais da FMU

Bruna Dutra Ribas

Graduando em Relações Internacionais da FMU

Juliana Fernandez de Assis

Graduando em Relações Internacionais da FMU

Leonardo Assunção Fontes

Graduando em Relações Internacionais da FMU

Shaula Chuery

Graduando em Relações Internacionais da FMU

 

 Em dezembro de 2019, foi descoberto na China um novo coronavírus denominado Sars-CoV-2, causador da Covid-19. Após um mês, o país implementou um lockdown na região para tentar conter a epidemia. A segunda maior economia do mundo decidiu que, em uma crise sanitária, é mais importante estancar os contágios e arcar com as consequências para o setor econômico funcionando e depois lidar com as consequências desta escolha.

 A epidemia se tornou global, e as expectativas de crescimento em todo o planeta foram revistas para baixo. A previsão do Banco Mundial é de uma queda de 5% do PIB brasileiro em 2020 (World Bank, 2020). A maioria dos países estão conscientes de que para abreviar a passagem da pandemia é necessário agilidade para salvar suas populações e que irão enfrentar graves dificuldades no setor econômico.

 Porém, as realidades são distintas e as ações tomadas estão correlacionadas às capacidades dos países. Enquanto os EUA injetam US$ 1,5 trilhão na economia (GAYER; COSTA, 2020), países em desenvolvimento sofrem de forma mais acentuada os efeitos econômicos dessa crise. Com a produção mundial em declínio e redução no preço das commodities, a relação com os outros Estados do Sistema Internacional também será alterada, levando à provável acentuação das desigualdades existentes entre as nações.

 Em uma crise multifacetada; que é ao mesmo tempo sanitária, humanitária, social e econômica, como os Estados podem encontrar saídas para o que se avizinha?

 No caso brasileiro, uma alternativa seria a exploração estratégica de sua mundialmente reconhecida capacidade de produção de vacinas. Graças ao Instituto Butantan e à Fundação Oswaldo Cruz (Fiocruz), somos autossuficientes em insumos imunobiológicos e exportamos 25 diferentes tipos de vacinas para mais de 70 países (MINISTÉRIO DA SAÚDE, 2017) .

 O Instituto Butantã é o maior produtor de vacinas de gripe do Hemisfério Sul e corresponde a 10% da produção mundial. Em 2019, forneceu ao Ministério da Saúde 65 milhões de doses de vacina contra a gripe e prevê para 2020 a entrega de 75 milhões de doses, em um contrato de aproximadamente R$ 700 milhões. Com 60% do seu portfólio voltado para a vacina da gripe, o Butantã teve um faturamento de aproximadamente R$ 1,6 bilhão em 2019. Ampliando sua capacidade produtiva, estima-se que possa fabricar 140 milhões de doses anuais e aguarda vistoria da OMS para exportação em larga escala para os EUA, Europa e Ásia (MACHADO, 2020).

 Já a Fiocruz se destaca no cenário internacional ao ser a maior produtora de vacina contra a febre amarela do mundo, exportando seu excedente através da Organização Pan-Americana de Saúde (Opas) e do Fundo das Nações Unidas para a Infância (Unicef). Em 2012, enviou 6 milhões de doses para a Costa do Marfim e 2,2 milhões para o Sudão. Neste mesmo ano, foram exportados mais de 5 milhões de doses para países da África e da América Latina e em 2017, mais de 2,8 milhões para a Venezuela, Equador, Colômbia e Angola (PONTE; PIMENTEL, 2017). Para 2020, está prevista a exportação de 23 milhões de doses através das organizações supracitadas (BRASIL, 2020).

 A pesquisa brasileira em biomedicina também merece destaque, com quadros técnicos qualificados. A exemplo, cabe destacar que os pesquisadores brasileiros – em parceria com a Universidade de Oxford sequenciaram o genoma do Sars-CoV-2 do primeiro paciente contaminado no Brasil em dois dias. A média mundial é de 15 dias. Possui quadros técnicos qualificados, tendo os pesquisadores brasileiros realizado o sequenciamento genético do Sars-CoV-2 do primeiro paciente infectado no Brasil no dia 28 de fevereiro de 2020 no Instituto de Medicina Tropical da USP (FAPESP, 2020).

 Neste cenário de incertezas que a pandemia representa, a busca por uma vacina é uma urgência, pois não se sabe exatamente quais as características desses vírus e boa parte do mundo corre contra o tempo atrás de uma solução. Diante do exposto, vê-se que o Brasil tem capacidade de produção e tecnológica para se tornar um expoente na fabricação de vacinas contra o novo coronavírus, o que ficou demonstrado com a parceria entre o MS e a Universidade de Oxford para a produção de vacinas com transferências da tecnologia.

 O que mais nos difere dos outros Estados que buscam essa resposta? A discussão perpassa por quem irá desenvolver e como. Nos EUA, por exemplo, esse desenvolvimento é através de empresas privadas, que recebem imensos aportes financeiros para desenvolvimento tecnológico. A Johnson & Johnson receberá o valor de US$ 421 milhões do governo norteamericano para a pesquisa da vacina (HUMER; MISHRA, 2020).

 Em contrapartida, no Brasil, com a pesquisa científica majoritariamente através de instituições públicas e constantes contingenciamentos orçamentários, exploram-se saídas locais e mais baratas. É neste contexto que, em 27 de junho, o Brasil anunciou parceria com a Universidade de Oxford e o laboratório inglês AstraZeneca para a produção de 100 milhões de doses de vacina e a transferência da tecnologia para a produção dos insumos.

 A decisão brasileira coloca o país na dianteira das pesquisas internacionais em busca de uma solução definitiva contra a COVID-19. Em que pesem os riscos envolvidos num investimento em pesquisa e desenvolvimento (P&D), o entendimento brasileiro é de que o conhecimento adquirido com essa parceria gerará um ganho para o Sistema Único de Saúde (SUS) e a produção de vacinas no país. Em um cenário de crise e incerteza, a decisão do Ministério da Saúde deve evidenciar uma escolha pela ciência e em prol da vida.

 

Rio de Janeiro - RJ, 4 de março de 2021.


Como citar este documento:
MACEDO, Gustavo; et al. Brasil e Covid-19: a produção nacional de vacina como forma de superar a crise? Observatório Militar da Praia Vermelha. ECEME: Rio de Janeiro. 2021.


Referência:

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  2. ARRUDAS, Mariana. Unicamp e USP desenvolvem teste rápido e barato para identificar coronavírus. Disponível em: http://www.inovacao.usp.br/unicamp-e-usp-desenvolvem-teste-rapido-e-barato-para-identificar-coronavirus/. Acessado em 16 de abril de 2020.
  3. BRASIL, Cristina Indio. Fiocruz retomará exportação de vacinas contra a febre amarela. Disponível em: https://agenciabrasil.ebc.com.br/saude/noticia/2019-10/fiocruz-retomara-exportacao-de-vacinas-contra-febre-amarela. Acessado em 16 de abril de 2020.
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  6. COLLUCCI, Cláudia. Ajuste fiscal trouxe perdas de R$ 20 bi à saúde em 2019, diz economista. Disponível em: https://www1.folha.uol.com.br/colunas/claudiacollucci/2020/03/ajuste-fiscal-trouxe-perdas-de-r-20-bi-a-saude-em-2019-diz-economista.shtml. Acessado em 18 de abril de 2020.
  7. EXAME. Economia global deve ter maior depressão desde os anos 30, diz FMI. Disponível em: https://exame.abril.com.br/economia/economia-global-deve-ter-pior-depressao-desde-os-anos-30-diz-fmi/. Acessado em 16 de abril de 2020.
  8. GAYER, Eduardo; COSTA, Gabriel Bueno da. Fed NY injeta mais de US$ 1,5 trilhão no sistema financeiro. Disponnível em https://economia.uol.com.br/noticias/estadao-conteudo/2020/03/12/fed-ny-injeta-mais-de-us-15-trilhao-no-sistema-financeiro.htm. Acessado em 17 de abril de 2020.
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Assunto(s): Covid , Brasil , Sars-CoV-2 , epidemia
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