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O Covid na linha de frente da Operação Acolhida

Publicado: Quarta, 05 de Agosto de 2020, 14h21 | Última atualização em Quinta, 06 de Janeiro de 2022, 11h31 | Acessos: 467

Luiz Eduardo Santos Cerávolo
Mestre do PPGCM da ECEME
Dan Milli Pereira
Doutorando do PPGCM da ECEME
Tássio Franchi
Professor do PPGCM da ECEME

A Operação Acolhida1 é uma grande força-tarefa humanitária executada e coordenada pelo Governo Federal, com apoio de agências da ONU e de mais de 100 entidades da sociedade civil, que oferecem assistência emergencial aos deslocados venezuelanos que entram no Brasil pela fronteira com Roraima (FRANCHI, 2019). A operação tem três eixos de atuação: ordenamento da fronteira, acolhimento e interiorização (BRASIL, 2020). Além dos funcionários dos governos e de voluntários, cerca de 660 militares das três Forças Armadas constituem a linha de frente da operação2. Essa Operação, considerada um case de sucesso, com milhares de migrantes acolhidos e interiorizados, agora enfrenta o desafio de proteger da pandemia do Corona Vírus integrantes e abrigados, nacionais e estrangeiros, sem diminuir a eficiência da Operação. As operações na região prosseguem, mesmo após o fechamento da fronteira com a Venezuela (previsão até o final do mês de abril), as atividades de ordenamento da fronteira e a interiorização se mantêm.

Os primeiros casos de Covid-19 foram confirmados pelo Governo de Roraima em 21 de março, a primeira morte em 3 de abril. Em 20 de abril já eram 222 casos confirmados e 76 suspeitos, com 3 óbitos. A maioria dos casos confirmados e suspeitos se espelham no eixo da BR-174 desde Pacaraima (fronteira com a Venezuela) até Rorainópolis, no entanto existem casos em Bonfim (na fronteira com a Guiana) e na região oeste do estado em Alto Alegre e Mucajaí (CIEVS. Boletim Epidemiológico nº 52; 65; 81. 2020). Era uma questão de tempo até os primeiros casos aparecerem entre os militares e civis que atuam na Operação Acolhida.

Antes mesmo da confirmação de casos na Operação e no Brasil, mais precisamente no dia 18 de fevereiro de 2020, foi estabelecido um Plano Emergencial de Contingenciamento para o Covid-19 (FT Log Hum, 2020), a fim de evitar o contágio dos integrantes da Operação e do público alvo, os imigrantes. Este documento foi elaborado coletivamente (FFAA + Agências), tendo como referência as orientações dos Ministérios da Saúde (MS), Ministério da Defesa (MD), Agência Nacional de Vigilância Sanitária (ANVISA), além de organizações internacionais humanitárias. Ele sofre atualização constante, de modo a acompanhar a conjuntura, sendo a última versão de 10 de abril de 2020. Prevê medidas profiláticas como: o monitoramento ativo, a limpeza e desinfecção de áreas, campanhas educativas, utilização de EPI, além de protocolos de higienização, de coleta de lixo e de distribuição e consumo de alimentos, a fim de permitir a continuidade dos trabalhos com segurança. Ainda, como medidas terapêuticas, o plano prevê o isolamento de suspeitos em área específica, dos doentes na área de isolamento de infectados (AII). Como ação deste plano, a Operação criou em Boa Vista a Área de Proteção e Cuidados (APC), a ser ativada nas próximas semanas, local destinado para o recebimento da população local, brasileiros e imigrantes, suspeitos e infectados. A APC tem por finalidade mitigar a carência de meios médicos estaduais e municipais na região, para isso utiliza militares da célula de Saúde da Força Tarefa Logística Humanitária (oriundos do VII e VIII contingentes).

Até o dia 19 de abril haviam sido notificados pelo Centro de Informações Estratégicas de Vigilância em Saúde (CIEVS) 222 casos confirmados, sendo a maioria homens entre 30 e 49 anos; com três mortes no Estado de Roraima (CIEVS, BE no 80. 2020). Dentre esses registros, 64 casos foram de militares da Operação Acolhida em Boa Vista, aos quais se somam 02 casos de militares sediados em Pacaraima, totalizando 66 casos (FT Log Hum. 2020b.). Todos seguindo os procedimentos discriminados no Plano Emergencial de Contingenciamento, encontram-se isolados e em tratamento.

Os casos confirmados de militares representam cerca de 10% do efetivo da Operação Acolhida e são em sua maioria oficiais superiores e subalternos (Ferreira, 2020). Todos foram tratados pela equipe médica da Operação Acolhida na área de proteção e cuidados (APE), não impactando a rede de saúde pública local. De modo geral, os militares têm apresentado complicações limitadas, sem a necessidade de internação em UTI. Uma explicação para isto é o metódico controle sanitário (médico, odontológico e vacinação) e rigorosa seleção do efetivo participante (preparo físico e mental), o que vem resultando em doentes com sintomas brandos. O ciclo de infecção e recuperação da tropa acontecerá e mais militares poderão ficar doentes nas próximas semanas, sendo isolados e substituídos em suas funções cotidianas por outros militares saudáveis. Isto evidencia uma característica da profissão militar, que é a passagem de função para outro quando não se está mais apto a continuar, além da disponibilidade permanente à Nação, mesmo com risco da própria vida (neste caso com risco da própria saúde).

É importante destacar que, além dos militares envolvidos diretamente na Operação Acolhida, o Estado de Roraima possui outras organizações militares como a 1ª Brigada de Infantaria de Selva, o 6º Batalhão e Engenharia e Construção, a ALA 7 da Força Aérea Brasileira, dentre outras organizações subordinadas, que poderão também fornecer recursos humanos para o recompletamento dos efetivos da Operação Acolhida, em último caso.

O ponto de atenção agora está nos venezuelanos abrigados, pois eles são uma população vulnerável a diversos tipos de doença, devido à condição de estarem concentrados nos abrigos. Essa vulnerabilidade das populações refugiadas é uma realidade que desperta preocupações mundo afora (MCAULIFFE, BAULOZ, 2020).

nrabrigadosFonte: CIEVS, 2020c. *Os suspeitos são isolados com seus familiares. Por isso o número de isolados é maior que o de suspeitos e confirmados.

Na Operação Acolhida, os controles sanitários e epidemiológicos já vinham sendo feitos desde o início. O controle da velocidade de infecção nos abrigos depende das medidas profiláticas já adotadas, mas também da cooperação por parte dos abrigados. Até o momento tais medidas se mostraram efetivas, sendo que nos mais de seis mil abrigados existem apenas três casos confirmados e cinquenta e seis suspeitos (todos já isolados). A montagem da Área de Proteção e Cuidados (APE) em Boa Vista, que deve ser ativada na próxima semana, sendo um importante avanço para a Operação no preparo para as próximas semanas de enfrentamento cotidiano da presença do Covid-19 entre seus militares e abrigados.

Por se tratar de um trabalho de ajuda humanitária importante, essencial para Roraima e para os estrangeiros abrigados, a Operação Acolhida vai seguir com sua missão, se adequando à nova situação do Covid-19, sem quebra de continuidade.

Rio de Janeiro - RJ, 27 de maio de 2020.


1 Esse trabalho está inserido nas atividades do projeto Defesa Nacional, Fronteiras e Migrações: estudos sobre Ajuda Humanitária e Segurança Integrada (Edital PROCAD-Defesa) com apoio da Coordenação de Aperfeiçoamento de Pessoal de Nível Superior (CAPES) e do Ministério da Defesa.
2 Excluindo aqueles que estão em trânsito, ou com licenças previstas em lei.


Como Citar este documento:

DINIZ, Ronay Souza. A Operação Acolhida e os Desafios Impostos pela Pandemia do Corona Vírus. Observatório Militar da Praia Vermelha. Rio de Janeiro: ECEME, 2020.


Referências:

ACNUR. Anuarios estadísticos. Disponível em: https://www.acnur.org/datos-basicos.html Acesso em: 19 abr 2020.

BRASIL. LEI No 13.684, DE 21 DE JUNHO DE 2018.

BRASIL, Governo Federal. Operação Acolhida: Plano Emergencial de Contingenciamento para COVID-19. Disponível em: http://www.eb.mil.br/documents/10138/11093495/PLANO+EMERGENCIAL+DE+CONTINGENCIAMENTO+PARA+COVID-19_compressed.pdf/35a27f3a-3756-058f-c0e0-18bbecbf84cd Acesso em: 14 abr 2020.

COHEN, Sandra. Pandemia exacerba a tragédia de refugiados. Disponível em: https://g1.globo.com/mundo/blog/sandra-cohen/post/2020/04/13/pandemia-exacerba-a-tragedia-de-refugiados.ghtml Acesso em: 14 abr 2020.

DRAY, William. Filosofia da História. 2a Edição ed. Rio de Janeiro: Zahar, 1977.

FRANCHI, Tássio. Operação Acolhida: A Atuação das Forças Armadas Brasileiras no Suporte aos Deslocados Venezuelanos. Military Review, v. [on line], n. janeiro, p. 1–13, 2019. Disponível em: https://www.armyupress.army.mil/Portals/7/military-review/Archives/Portuguese/Online%20Exclusives/Franchi-operacao-acholhida-a-atuacao-das-forcas-armadas-brasileiras-no-suporte-aos-deslocados-venezuelanos-Jan-2019-1.pdf

MCAULIFFE, Marie; BAULOZ, Céline. The coronavirus pandemic could be devastating for the world’s migrants. Disponível em: https://www.weforum.org/agenda/2020/04/the-coronavirus-pandemic-could-be-devastating-for-the-worlds-refugees/ Acesso em: 14 abr 2020.

UN. Venezuela Situation. Disponível em: https://data2.unhcr.org/en/situations/vensit Acesso em: 17 abr 2020.



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