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Cabos Submarinos: conectividade, defesa e os novos horizontes geopolíticos

Publicado: Quinta, 06 de Fevereiro de 2025, 01h01 | Acessos: 248

 

Claudia Cataldi
Jornalista. Mestre em Ciência Política e Presidente da
Associação Brasileira de Imprensa de Mídia Digital e Eletrônica - RJ


Sob o vasto território inexplorado dos oceanos, correm as artérias digitais que sustentam a comunicação global. Invisíveis aos olhos, mas vitais para o funcionamento do mundo moderno, os cabos submarinos desempenham um papel crucial na conexão entre continentes, nações e culturas. Não são meros fios que atravessam as profundezas; são estruturas que possibilitam a fluidez de dados que impulsionam economias, governanças e relações internacionais. Mais de 99% do tráfego mundial de informações passa por essas redes, consolidando-as como os verdadeiros alicerces do mundo digital.

Desde a instalação do primeiro cabo telegráfico transatlântico em 1858, que conectou os Estados Unidos à Grã-Bretanha, a evolução dessa infraestrutura é um testemunho da genialidade  humana na superação dos limites impostos pela distância e pelo tempo. Hoje, cabos de fibra ótica, tecnologicamente avançados, atravessam oceanos, transmitindo dados à velocidade da luz. Essas estruturas totalizam mais de 1,3 milhão de quilômetros, comprimento suficiente para dar 32 voltas ao redor do planeta. Entretanto, a complexidade e a relevância dessa rede transcendental não se limitam à sua dimensão física.

Do ponto de vista geoestratégico, os cabos submarinos configuram-se como ativos de importância inestimável. Aproximadamente 10 trilhões de dólares em transações financeiras cruzam diariamente por essas redes, evidenciando sua centralidade no funcionamento das economias modernas. Contudo, sua relevância vai além do aspecto econômico. Os cabos submarinos são também pilares da segurança nacional, pois garantem a continuidade das comunicações governamentais e militares em tempos de crise. Além disso, asseguram a transmissão de dados estratégicos e informações sensíveis que sustentam as estruturas de governança e defesa dos Estados soberanos.

Os desafios associados à governança e proteção dessa infraestrutura crítica demandam soluções inovadoras e colaborações interinstitucionais. A Constituição Federal de 1988, em seu artigo 21, inciso XI, delega à União a responsabilidade pela exploração e regulação dos serviços de telecomunicações, englobando os cabos submarinos. Esse marco jurídico não apenas reforça a soberania nacional sobre tais recursos, como também estabelece um arcabouço para que o Estado atue como guardião da integridade e segurança desses sistemas.

A defesa dos cabos submarinos também é abordada no Livro Branco de Defesa Nacional, que enfatiza a necessidade de proteger infraestruturas essenciais para o funcionamento do país. No âmbito militar, o Plano Estratégico da Marinha (PEM 2040) apresenta diretrizes claras para a salvaguarda do Atlântico Sul, apontando para o uso de tecnologias de ponta e a cooperação internacional como pilares dessa estratégia. As diretrizes traçadas pelo PEM 2040 também enfatizam ainda a importância da integração entre iniciativas civis e militares para a promoção de um ambiente seguro e resiliente para a conectividade submarina.

A costa brasileira, com seus mais de 7.400 km, destaca-se como uma região de vital importância para a segurança dos cabos submarinos. A extensa plataforma continental do país abriga cabos que conectam o Brasil a diversos continentes, configurando o Atlântico Sul como um verdadeiro hub de conectividade. Para garantir a segurança desses ativos, as Forças Armadas desempenham um papel central, desde a vigilância de áreas estratégicas até a supervisão das instalações submarinas. Essa vigilância também é reforçada por operações conjuntas com parceiros internacionais, ampliando a capacidade de resposta do Brasil frente a ameaças emergentes.

Entre elas, destaca-se o uso de submarinos especializados para interceptação de dados, um fenômeno que tem sido observado em operações conduzidas por potências globais. Tais atividades ressaltam a necessidade de se avançar em inteligência cibernética e monitoramento subaquático. Tecnologias como drones submarinos e sensores inteligentes emergem como soluções promissoras, alinhando-se às diretrizes do PEM 2040 e ao compromisso brasileiro com a segurança coletiva, conforme preconizado no artigo 91º da Constituição Federal. Essas ferramentas tecnológicas são complementadas por esforços de capacitação técnica e científica, ampliando a expertise nacional no monitoramento e proteção de cabos submarinos.

Ademais, a concentração da posse e manutenção dos cabos em mãos de poucas corporações privadas, muitas delas sediadas em países do hemisfério norte, suscita preocupações sobre soberania digital e dependência tecnológica. Para mitigar esses riscos, o Brasil tem investido em projetos como o cabo EllaLink, que estabelece uma conexão direta entre o Brasil e a Europa, reduzindo a dependência de rotas intermediadas pelos Estados Unidos. Essa iniciativa representa não apenas um passo em direção à autonomia tecnológica, mas também um marco na promoção de parcerias estratégicas. Além disso, esforços como o fortalecimento do setor de pesquisa e desenvolvimento em telecomunicações reforçam a capacidade brasileira de inovar e competir globalmente.

Olhar para o futuro dessa infraestrutura é contemplar o advento de tecnologias disruptivas, como as redes quânticas. A criptografia quântica, por exemplo, promete um nível sem precedentes de segurança, uma vez que qualquer tentativa de interceptação altera imediatamente o estado dessas partículas, tornando a invasão perceptível. Além disso, a integração entre satélites e cabos submarinos surge como solução complementar, ampliando a capacidade de conectividade e oferecendo redundância em cenários de crise. A complementaridade entre essas tecnologias tem o potencial de transformar radicalmente o panorama da conectividade global, estabelecendo novos padrões de eficiência e segurança.

No plano geopolítico, os cabos submarinos configuram-se como instrumentos de poder e diplomacia. A disputa por rotas e zonas de instalação reflete as tensões entre nações e a busca por hegemonia tecnológica. Para o Brasil, consolidar-se como um protagonista nesse cenário requer uma combinação de investimento em infraestrutura, desenvolvimento de competências técnicas e uma diplomacia ativa que promova a cooperação internacional. O PEM 2040 enfatiza a necessidade de fortalecer a presença brasileira em áreas de alta relevância estratégica, ampliando sua influência e garantindo a proteção dos interesses nacionais. A coordenação entre atores nacionais e internacionais, no entanto, deve ser guiada por princípios de soberania e respeito mútuo, conforme delineado na Constituição Federal.

A relevância dos cabos submarinos transcende o seu aspecto técnico, configurando-se como um tema central nas discussões sobre segurança, desenvolvimento e soberania no século XXI. Esses cabos não são apenas instrumentos tecnológicos; são veias pulsantes que sustentam o fluxo da informação, conectando economias, sociedades e governos. Sua preservação e aprimoramento demandam um compromisso coletivo, no qual o Brasil tem a oportunidade ímpar de assumir um papel de liderança, alinhando-se às exigências da era digital e às aspirações de uma nação soberana e tecnologicamente independente. Ao navegar pelos desafios e oportunidades apresentados por essa infraestrutura crítica, o Brasil reafirma sua posição como um ator estratégico na arena global, promovendo um futuro mais conectado e seguro para todos.

 

 

 

Rio de Janeiro - RJ, 06 de fevereiro 2025.


Como citar este documento:
Cataldi, Claudia. Cabos Submarinos: conectividade, defesa e os novos horizontes geopolíticos. Observatório Militar da Praia Vermelha. ECEME: Rio de Janeiro. 2025.

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