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O Exército Brasileiro e a sustentabilidade do meio ambiente

Publicado: Segunda, 27 de Março de 2023, 01h01 | Última atualização em Segunda, 27 de Março de 2023, 11h53 | Acessos: 945

 

Luciano Hickert
 Tenente Coronel do Exército Brasileiro. Bacharel em Direito pela
 Universidade Federal do Rio Grande do Sul (2017).
Atualmente é Comandante do 8º Batalhão Logístico

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 1 . Introdução

As questões relacionadas ao meio ambiente vem assumindo um protagonismo cada vez mais crescente ao longo dos anos. É comum ver notícias relacionadas ao mau uso, ou utilização irresponsável do meio ambiente pelo homem. Não raro, tais condutas são sempre associadas às intempéries climáticas que ocorrem ao redor do globo. Ou seja, fica cada vez mais claro que o homem é responsável, parcial ou totalmente, pelas mudanças climáticas em curso.

No Brasil, essa responsabilidade está tipificada no documento de mais alto nível. A Constituição Federal de 1988, em seu artigo 225, prevê o direito ao meio ambiente ecologicamente equilibrado, sendo dever do poder público e da sociedade defendê-lo e preservá-lo. Dessa forma, o Estado brasileiro, materializado pelos seus diversos órgãos em todas as suas esferas de poder, tem a missão constitucional de estimular, fiscalizar e fomentar o desenvolvimento sustentável, assim como as práticas ambientais de preservação do bioma nacional (BASSO; DIAS, 2018).

O Exército Brasileiro, como integrante da esfera pública federal, está envolvido em processos que interagem com o meio ambiente, como qualquer outro segmento produtivo. Os militares conduzem um vasto leque de atividades que, em muitos aspectos, podem se assemelhar às empresas ou às indústrias privadas, tais como: utilização de veículos comerciais, construção de prédios e urbanização de espaços, destinação de resíduos hospitalares, logística reversa com combustíveis, destruição de materiais explosivos, dentre outras atividades (BASSO; DIAS, 2018). O leque de atividades com os impactos ambientais é muito extenso, envolvendo as atividades administrativas e operacionais, tendo diversas correlações com ramos civis. Nesse sentido, restaurantes, hospitais, postos de combustíveis, oficinas mecânicas e hotelaria são exemplos de atividades militares que se espelham às atividades civis e que, por mais administrativas que sejam, impactam o meio ambiente de alguma forma. Diante dessa realidade, este artigo procura apresentar as iniciativas realizadas pelo Exército Brasileiro a manter o meio ambiente sustentável.

2. A evolução da temática no Exército Brasileiro

Em 2016, o Exército Brasileiro elaborou diversos cadernos de orientação voltados para auxiliar as Organizações Militares na gestão do meio ambiente. Naquele anos, tais produtos representaram um marco para a evolução das práticas de gestão na instituição. Em 2017, o Exército Brasileiro avançou na temática e produziu uma cartilha de orientações, iniciativa que consolidou a Diretoria de Patrimônio Imobiliário e Meio Ambiente como sendo a propulsora do assunto no Exército Brasileiro, difundindo o conhecimento através de cursos e capacitações, expandindo a educação ambiental para o Exército Brasileiro como um todo.

As evoluções do cuidado com o meio ambiente implicam em um conjunto de ações simples e complexas que abarcam a administração das organizações militares. Nos últimos anos, as preocupações com o meio ambiente aumentaram de forma exponencial, dando origem a um conjunto de normas, cartilhas e orientações que se complementam, criando um arcabouço que visa orientar os gestores militares.

“O Sistema de Gestão Ambiental do Exército Brasileiro  (SIGAEB) orienta as ações da política militar terrestre para o gerenciamento ambiental efetivo em todos os escalões, em caráter permanente, promovendo a harmonia com os ecossistemas, com comprometimento e capacitação dos recursos” (BRASIL, 2019).

Em 2022, pode-se destacar que todos os militares em funções gerenciais nas Organizações Militares já possuem capacitação adequada, e a busca de aperfeiçoamento tem sido uma constante, em diversos níveis de gestão. Diversos cursos e estágios tem desenvolvido a educação dos gestores e tem sido integrado ao currículo dos cursos, garantindo uma base de conhecimento adequada para a melhoria das práticas. O conteúdo desses cursos abarca os resíduos sólidos, a gestão de afluentes, e se estende até mesmo para as atividades operacionais, com o cuidado do solo, da fauna e da flora.

Dentre as orientações dos estágios e cursos, o gerenciamento de resíduos abarca os diversos tipos de materiais. Tanto os sólidos, incluindo os de logística reversa, os de saúde e os orgânicos, quanto os hídricos, relacionados ao abastecimento de água potável. As novas diretrizes do SIGAEB visam evitar novos problemas e resolver passivos antigos, recuperando áreas e destinando corretamente o material inservível de forma adequada, preocupando-se inclusive com a poluição sonora.

3. As iniciativas realizadas pelo Exército Brasileiro para proteger o meio ambiente

Uma das iniciativas é voltada para o adestramento da tropa. Nesse caso, o Exército Brasileiro determinou uma gama de cuidados com a fauna e flora, com o solo e com os recursos naturais das áreas utilizadas durante as atividades de instrução, dentre os quais destacam-se o cuidado para evitar queimadas e a destinação do lixo e resíduos.

Outra iniciativa é sobre a atividade logística. Nesse ponto, a instituição estabeleceu normas especiais para as tropas de logística, pois elas realizam a entrega e recolhimento de produtos de saúde, de combustíveis e de diversos materiais considerados mais críticos, como munições e transporte de cadáveres em combate, cuja eficácia pode preservar vidas e o ecossistema, evitando doenças e poluição. A logística de material de saúde, em especial de medicamentos e material de proteção, tornou-se ainda mais importante em épocas de pandemia, tornando o adestramento dos militares uma condição essencial para a preservação de um ambiente hígido e protegido. A manipulação de uma série de produtos químicos sensíveis exige uma cadeia de suprimento, manipulação e destruição bem estruturada, dentro e fora das unidades militares, e incluem ainda a manipulação de agentes biológicos, nucleares e radioativos.

É importante ressaltar os esforços realizados pelo Exército Brasileiro na área administrativa, mais precisamente nos processos licitatórios. Atualmente, os processos administrativos, como os licitatórios, estão restringindo cada vez mais o emprego de materiais tóxicos, como o amianto. Por sua vez, tais processos estão buscando soluções mais sustentáveis e menos poluentes, como o uso de sensores de presença, energias renováveis, reutilização de água e individualização dos consumos.

Ainda, a previsão de licenciamentos ambientais para todas as obras reflete o aperfeiçoamento dos sistemas. A ampliação da logística reversa para determinadas classes de materiais, sobretudo de peças de veículos e maquinário em geral, são tendências irreversíveis, que tem tornado mais efetiva a preservação do meio ambiente. Nesse sentido, a preparação das empresas fornecedoras é essencial para o correto fluxo de entrega e retirada de insumos, visando a reciclagem e reaproveitamento. Dessa forma, a aquisição de novos meios deve estar em consonância com as tecnologias mais adequadas, levando em consideração o custo ambiental de cada material. Nesse sentido, estão sendo evitadas as compras de material com baixa vida útil, com maior potencial poluente e estão sendo priorizadas opções mais sustentáveis, como a substituição do óleo S500 por S10, com menos enxofre e menor potencial poluidor.

A correta destinação de peças usadas e recursos, assim como a reutilização de peças e materiais por recondicionamento, é outro aspecto importante que tende a diminuir a produção de resíduos. Além disso, pode ocorrer economia com a diminuição de necessidade de aquisição de peças novas, mais caras. Ainda, a correta destinação de óleos usados pode gerar uma renda adicional para o país e pode se tornar numa medida muito efetiva para a redução da poluição. Além disso, a definição de áreas de proteção, preservação ambiental, encostas e área verdes urbanas tem recebido atenção crescente, influenciando na qualidade dos rios e na própria qualidade de vida das pessoas.

Na parte operativa, a instituição também registra significativos avanços. O manual Logística nas Operações, do Exército Brasileiro e publicado em 2019, destaca que um aspecto fundamental nas operações é a obtenção de dados médios de planejamento confiáveis e atualizados que permitam uma correta avaliação das necessidades, diminuindo o consumo e reduzindo os resíduos. Outro ponto destacado no citado manual se refere ao preparo da tropa. Com isso, tem se notado que as instruções sobre a preservação do meio ambiente estão sendo cada vez mais ministradas junto aos militares, destacando o cuidado com a fauna e flora.

Nessa mesma direção, o equilíbrio entre modernização e rusticidade dos equipamentos militares tem sido buscado pelo Exército Brasileiro, como se percebe com a adoção de veículos mais econômicos, menos poluentes e pela utilização de combustível com menos enxofre. Talvez evoluções como a adoção de motorização elétrica não possam ser estendidas para toda a frota, pela necessidade de investimento e pelos requisitos operacionais, mas percebe-se que a tendência de adoção de tecnologias menos poluentes são a tendência.

Por outro lado, uma nova família de veículos elétricos, acompanhando as tendências da produção civil, ainda não foi iniciada no mercado internacional militar. O mercado de defesa não tem adotado tais inovações, mas parece ser a tendência para veículos administrativos, apresentando constantes novos desafios para a manutenção, pois o crescente aumento de tecnologia embarcada apresenta novas exigências para o conserto de sensores, inclusive acerca de níveis de emissão de poluentes.           

4. Considerações finais

A sustentabilidade tem sido uma preocupação crescente da sociedade brasileira e o Exército Brasileiro tem realizado diversas ações para aumentar a conscientização dos seus militares, a fim de melhorar os processos e difundir as melhores práticas. Nesse sentido, a obtenção de meios mais eficazes, que reduzam a produção de resíduos, e a construção de estruturas de modo sustentável, tem recebido atenção crescente, colaborando na proteção do meio ambiente .

A busca da eficácia administrativa deve evoluir constantemente para a implantação de maiores cuidados com o meio ambiente, empregando uma ampla gama de aperfeiçoamentos para a melhoria das atividades produtivas, com economia, sem comprometer a capacidade de ação dos diversos setores. Em especial na logística, seja de pessoal, seja de material, é importantíssimo o estudo das viabilidades e o cuidado com a implantação de tecnologias menos poluentes e mais eficazes.

Nesse diapasão, a alteração das fontes de energia, a delimitação de quais e quantos produtos serão adquirido e distribuídos, de como os produtos podem ser reutilizados, e a ampla variedade de questões levantadas neste estudo exigirão um questionamento permanente na busca de economia de recursos naturais. A ampliação da infraestrutura, com o aproveitamento de recursos renováveis e os cuidados com a reciclagem são temas cada vez mais comuns no seio militar.

A implantação de um sistema integrado de gestão logística permitiria o conhecimento da situação real e oportuna das necessidades logísticas e a modernização dos fluxos de solicitação de suprimentos, por programas automatizados que utilizem tecnologia para facilitar a separação e embarque das cargas, fato que aumenta a eficiência dos processos logísticos e amplia a proteção ao meio ambiente.

Adequar a estrutura logística planejada para situações de emprego real, com soluções sustentáveis, impactará na doutrina militar brasileira vigente, em especial no trato de feridos e mortos. Repensar a logística de combate, adequada ao novo perfil de combates urbanos, multidimensionais e não lineares, significa estudar as novas necessidades de energia, proteção das áreas e volumes a serem deslocados. O aumento do controle sobre os bens, como armamento, munição, veículos e alimentos, e a reutilização de materiais de boa qualidade, poderá resultar em maior poder de combate num futuro próximo.

As Forças Armadas brasileiras podem se tornar num ambiente de experimentação para a administração pública, estabelecendo parcerias com universidades e empresas, realizando processos de transformação de fontes de energia, reutilização de meios naturais e cuidados com o meios ambiente, trazendo benefícios que podem ser ampliados para toda a sociedade, em diversas área da economia, ciência e empreendedorismo.

Obter a capacidade de sustentar as mobilidades operacional e tática deve ser uma prioridade de uma Força Terrestre que busque o combate moderno, em um ambiente complexo e com demandas de diferentes atores no campo de batalha. Essa sustentação deve ser estendida também para o meio ambiente, como forma de manter com menores custos as operações. Assim, pode-se depreender que no atual tabuleiro geopolítico, o meio ambiente é uma variável inescapável para o planejamento e condução de quaisquer atividades militares.

 

 

 Referências Bibliográficas: 

  1. BASSO, Leandro Ferreira; DIAS, Raphael da Silva. Análise da sustentabilidade ambiental com o auxílio do SICOGEA em uma organização militar da guarnição de Santa Maria-RS. Trabalho de Conclusão de Curso na Universidade Federal de Santa Maria, 2018. Santa Maria: UFSM, 2018.

  2. BRASIL. Exército Brasileiro. Estado-Maior do Exército. Logística nas Operações - EB70-MC-10.216. Brasília: Estado-Maior do Exército, 2019.

 

Rio de Janeiro - RJ, 27 de março de 2023.


Como citar este documento:
Hickert, Luciano. O Exército Brasileiro e a sustentabilidade do meio ambiente. Observatório Militar da Praia Vermelha. ECEME: Rio de Janeiro. 2022.  

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