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As manchas de óleo como desastre ambiental e a resposta interagências

Publicado: Sexta, 03 de Janeiro de 2020, 08h01 | Última atualização em Quinta, 06 de Janeiro de 2022, 13h51 | Acessos: 1399

Mariana Montez Carpes1

Em 30 de agosto de 2019, apareceram nas praias do litoral do nordeste brasileiro manchas de óleo de origem inicialmente desconhecida. O evento daria origem ao maior desastre ambiental deste tipo no Brasil - em relação à extensão geográfica e duração. No total, mais de 70% dos municípios do litoral nordestino foram atingidos. O desastre ainda em curso, mas já controlado, alcançou também praias do Estado do Espírito Santo, totalizando 720 praias brasileiras afetadas, segundo relatório do IBAMA divulgado em novembro de 2019.

As causas do desastre, que afetou principalmente a fauna marinha e a economia local que vive da pesca e do turismo, seguem indefinidas. Segundo as investigações em andamento, o óleo teria vazado do navio grego Bouboulina que carregava 1 milhão de barris de petróleo venezuelano e dirigia-se deste país à Malásia. No percurso, teria cruzado o litoral da Paraíba, foco dos primeiros registros de óleo nas praias brasileiras.

A resposta ao desastre, considerando sua magnitude e impacto, demandou uma resposta coordenada entre instituições públicas e privadas, civis e militares e das três esferas da Federação. Destaque deve ser dado à ativação do Grupo de Acompanhamento e Avaliação (GAA) formado pela Marinha do Brasil (MB), Agência Nacional de Petróleo (ANP) e Instituto Brasileiro do Meio Ambiente e dos Recursos Naturais Renováveis (IBAMA). O GAA trabalha em coordenação com o Instituto Chico Mendes de Conservação da Biodiversidade (ICMBio), Polícia Federal, Petrobrás, Defesa Civil, Exército Brasileiro (EB) e Força Aérea Brasileira (FAB). Considerando o ineditismo do evento, as investigações seguem a mesma lógica interagências da resposta, coordenando e integrando instituições como a Organização Marítima Internacional, a Guarda Costeira dos EUA, a Administração Nacional Oceânica e Atmosférica do Departamento de Comércio dos EUA e outras.

Cumpre notar, ainda, que como consequência do desastre foi estabelecida em novembro a Operação Amazônia Azul - Mar Limpo é Vida, no âmbito do Plano Nacional de Contingência. O grupo-tarefa compreende três pilares de natureza técnica; a investigação realizada pela Autoridade Marítima em parceria com a Polícia Federal, a contenção das manchas de óleo e o controle dos danos causados. Ainda, é composto pelos navios do Comando do Grupamento de Patrulha Naval do Norte, por Fuzileiros, aeronaves e por navios do Comando da Flotilha do Amazonas. O controle da Operação ficou a cargo do Comando do 4º Distrito Naval e também é de natureza interagências.

A participação das Forças Armadas na resposta ao incidente se dá no âmbito das ações subsidiárias previstas pelo artigo 142 da Constituição Federal e explicitadas pela Lei Complementar nº 97, de 09 de junho de 1999.

Além da coordenação interagências para a limpeza do litoral, contou-se ainda com um contingente de voluntários que foram às praias recolher o óleo depositado na areia. O trabalho voluntário, ainda que uma importante demonstração de consciência e compromisso social, representa um perigo aos próprios voluntários, quando da ausência de equipamentos de proteção individuais (EPIs), pelo nível de toxicidade do óleo. O petróleo contém três compostos voláteis altamente cancerígenos e que podem adoecer o sistema nervoso central, a saber, o benzeno, o tolueno e o xileno. Assim, o voluntariado seguro demanda o esforço público de preparação de pessoal e conscientização dos riscos envolvidos neste tipo de trabalho.

Desde o início de dezembro o fluxo de óleo que (re)aparece nas praias é cada vez menor. De acordo com o Almirante de Esquadra Marcelo Campos, coordenador do GAA, a situação está controlada. Todavia, seguem as investigações sobre os responsáveis pelo vazamento, bem como o monitoramento e limpeza da costa.

O episódio, ainda que sem precedente e com implicações sócio-econômicas, ambientais e de saúde pública por serem dimensionadas, lança luz sobre alguns aspectos fundamentais para a reflexão sobre desastres, operações interagências e, não menos importante para esta seção do OMPV, defesa QBRN. Começando por esta última, é digno de nota que este não é um evento QBRN “puro”, todavia, o nível de toxicidade dos elementos químicos componentes do petróleo demandam um cuidado qualificado na resposta, com destaque para a necessidade de uso integral dos equipamentos de proteção individual para a pele, olhos e vias respiratórias, além do manejo e acondicionamento dos rejeitos recolhidos para evitar futuras contaminações de solo. No que se refere aos dois outros aspectos, a resposta aos desastres, por sua magnitude e riscos, revela a necessidade de respostas coordenadas de natureza interagências e, por vezes, com acionamento de apoio internacional, como foi o caso. Neste sentido, quando melhor explicitados os marcos normativos que versam sobre essas coordenações, na forma de políticas públicas específicas, tanto mais eficientes e rápidas serão as respostas. Assim, ganham a população, os órgãos responsáveis e o Estado Brasileiro.

 


1 Pesquisadora e Professora no Programa de Pós-Graduação em Ciências Militares do Instituto Meira Mattos, na Escola de Comando e Estado-Maior do Exército (RJ).


Fontes: G1, MB, MD, Planalto:

- https://g1.globo.com/natureza/desastre-ambiental-petroleo-praias/noticia/2019/11/21/mais-de-700-localidades-foram-atingidas-por-manchas-de-oleo-no-litoral-brasileiro-diz-ibama.ghtml
- https://g1.globo.com/natureza/desastre-ambiental-petroleo-praias/noticia/2019/10/24/petroleo-tem-benzeno-tolueno-e-xileno-que-trazem-riscos-graves-a-saude-diz-especialista.ghtml
- https://www.marinha.mil.br/manchasdeoleo/sobre
- https://www.marinha.mil.br/noticias/comando-do-4deg-distrito-naval-inicia-operacao-amazonia-azul-mar-limpo-e-vida
- https://www.defesa.gov.br/noticias/63706-coordenador-do-gaa-afirma-que-situacao-das-manchas-de-oleo-esta-controlada
- https://www.defesa.gov.br/noticias/62304-ministro-da-defesa-visita-o-nordeste-e-comprova-eficiencia-de-militares-e-voluntarios-civis-na-limpeza-das-praias
- http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/leis/lcp/lcp97.htm

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